quarta-feira, abril 21, 2004

Recordações II

Apesar dos discursos clarificadores de Spínola, muitos militares guardavam em seu coração rancor contra os africanos. Para os tais os africanos eram responsáveis por eles estarem na guerra. Tendo isto em consideração é fácil calcular que muitas atitudes erradas eram tomadas.
Lembro-me particularmente de algumas. Aqui vai a primeira: Certa vez, no Chugué, foi detido um homem africano com os seus 25/30 anos e imediatamente acusado de ser terrorista(assim se chamava aos homens do P.A.I.G.C., movimento que orientava a luta pela independência). Foram chamados peritos de Bissau para interrogarem o homem e enquanto eles não vinham ele estava guardado por um soldado português dentro de uma tabanca.
Quando se constou entre os militares portugueses, alí estacionados, que o "turra" estava na tabanca guardado apenas por um soldado, muitos se dirigiram para lá e agrediram o homem com tal violência que este ficou com o rosto irreconhecível.
Avisado do sucedido fui para lá e vendo o estado do homem não me contive e desatei a chorar.
Lembro-me do ódio, misturado com as palavras, com que alguns a mim se dirigiam:
"Estás a chorar por um preto? Preferias que ele nos fizesse isto a nós? É isso que te ensina a tua religião?"
Mais tarde veio a descobrir-se que, afinal, o homem era apenas um negociante de gado.
Ai os juizos precipitados...
Realço a atitude correcta do comandante da companhia que só não castigou severamente os agressores porque estes se encobriram uns aos outros.


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